quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Outro dia

Amanheceu
E não era a falta de óculos
A visão estava turva de lágrimas
Amargas, salgadas, com mais (des)gosto
Que o resto da vida
E essa maresia enferrujou
As minhas cordas vocais
Arranhou minha garganta
E a voz tornou-se 
Depois, inaudível
Antes, indistinta de quaisquer grunhidos
E o grito ficou preso
E mesmo que as lágrimas 
Tenham sido secas no lençol sujo
Ainda não via a saída
E, no banheiro, ajoelhado
Vomitei todas as amarguras consumidas
Durante toda a insônia 
Da noite passada

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Eu, que já disse, certa vez, je t’aime
Me vi presente na autodescoberta
De um old but good
Sangue latino correndo in my soul
Saciando a sede de um coração
Abarrotado de espaços vazios
Eu, que não sei dizer I love you
Sem esquecer o que realmente quero ouvir
De volta, como pedido de socorro
Enquanto a insistente baladinha underground
Tocava no rádio - I’ve cut myself again
 - e de novo
Eu, que só te queria by my side
Na presença de la petit mort
  - Don’t let me die here
Sei que você ouvia a minha voz suplicando
Eu nunca soube fingir que você não acreditava
Que não era real para mim
Que não era real para ambos
Eu fugi do abraço desse desprezo querido?

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Fome

Este riso maldito 
Dentro da minha cabeça
Não vai embora.
Não vá embora.
Já me fez desalinho. 
Eu posso suportar?
Eu nem quero mais brincar
De ser eu
Se dentro eu mostro 
Eu, monstro
Sou eu?
O prazer deste estado
De dor funesta
De um auto luto divertido,
Sofrido, pervertido
É indescritível
Eu, parasita de mim
Queimando, destruindo
Sugando o eu que pensava ser bom
O que eu pensava ser
Deixando pra trás 
Este sorriso maldito
Apenas
Dentro da minha cabeça

domingo, 22 de junho de 2014

Já distorci discursos inteiros
Até mesmo imagens - as minhas, mas
Qual imagem tenho de mim?
Esta ilusão que vejo e sinto é real
Devo escolher para ser, mas
Não me escolho - furtivo, bandido
Subtraio meus próprios horizontes
Pelo distante não tenho interesse
Quero o teu mais presente, imediato
Aquele que vai além de mim
Que encontra minhas profundas raízes
Contemplando minha mais pura miragem
Que realidade sou eu?
Que outro não tem, sequer, pedaço de mim?
Nessa troca de possibilidades
Na profundidade de olhares
Algo meu - há tempos recôndito - se perde

sábado, 12 de abril de 2014

Don't rest in peace

Estar doente é engraçado.
De uma forma trágica, acho engraçado, pois
Busca-se a cura dos males de todos,
 - não apenas nossos.
Quer-se brincar do que não se pôde um dia,
Viajar para locais improváveis e
Ver o mundo aos olhos, agora, curiosos pela doença.
Estar em contato com o transcendental ou divino
E, ao mesmo tempo, esbanjar-se no consumo de tudo que é proibido
Aqui mesmo, nesta minha terra de ninguém.
Entregamo-nos aos verdadeiros sentimentos
Pedidos completamente arrependidos de perdão,
Rendição completa aos abraços eternos – de despedida;
É estranho e divertido como o mal nos ensina a viver,
A dar sem esperar receber, pois pode não haver volta;
A tirar as trancas mais óbvias e desarmar-se
A perder a guerra, pois não há motivo para lutas vãs
Não existem mais lutas ou motivos para perder.
Estar doente, caros saudáveis, é isto:
Saber que a vida é demasiadamente efêmera
Para edificarmos prisões em vez de pontes,
Rastejar, em vez de voar.
Reclamar, em vez de viver.
E quando tudo acabar – sim, vai logo acabar...
Não sou digno de pena ou de olhares tortos
Tua hora também chegará.
Que se foda, a hora chegou e eu estou indo!
Minha doença é querer ser feliz
E não posso ficar aqui parado.

sábado, 15 de março de 2014

Eu, que só queria viver e lembrar,
Resolvi me esquecer e me recriar
De novo, mais uma vez e
Quantas fossem necessárias
Até quando pudesse encarar
O meu reflexo sem temer,
Sem me desesperar,
Sem ter de ouvir os gritos
Da alma sofrida
Daquele ser que vivia
Num passado já dormente
Que agora só se faz presente
Nos espelhos quebrados
Que não mais encaro
Nas poças d'água, distorcido
Ainda refletido, sim, 
Mas que não mais reconheço
Como meu,
Apenas outro eu
Que só queria viver e lembrar.

sábado, 1 de fevereiro de 2014

Visão passageira

A forma que tu tens a mim
É tão ridícula!
Em minha mente residem os planos mais sólidos e 
A realidade é demasiada diferente.
Eu me rendo, me entrego, me humilho!
Refém de carinho, cárcere da tua lembrança.
Amanhã, talvez, eu já não esteja assim
Talvez eu não esteja aqui
E agora tu vens com meus desejos em mão.
E eu, sem fim, 
Já não me caibo,
Me acabo...

(In)ação

A vida vai passando e a gente não se dá conta.
É tanta conta, tanto conto, pouca história de verdade
E eu me pego chorando por um filme
E eu me vejo em um filme real sem choro nem vela
Sem roteiro, sem direção
Apenas na tua direção
Sem cortes, só feridas.
Sem final feliz, pois nenhum final é feliz.
A felicidade está no meio da película,
No transcorrer dessa trama,
Nas cenas engraçadas de drama,
Nos closes de horror.
Nos créditos e agradecimentos àqueles que nunca ajudaram.
E eu fui até esse extremo, confesso.
E me deixei por lá.
E deixei por lá o que não havia,

Necessariamente o que não quis deixar.