terça-feira, 15 de novembro de 2011

Ouço a voz da mãe pedindo que eu jogue um cigarro. Acendo um para ela e jogo pela janela da mesma forma que joguei as minhas esperanças faz muito tempo. Acendo um cigarro para mim. Agora na sala um velho cinzeiro de metal vai se enchendo com as cinzas da minha companhia. Cinzas do que foi já foi algo. Já foi prazer. Já fui prazer. Agora cinzas e apenas cinzas. A vida se tornou como o filtro daquele cigarro que fumei. Passa a ilusão de que o pior ficou para trás, quando se sabe que por mais prazer que se tenha durante os tragos de felicidade, absorve-se somente o ruim e se ganha uma grande ferida, um câncer para a alma.
Entretanto, mesmo sabendo quão ruim tudo pode ser, sempre preciso de mais um cigarro, de mais uma ferida, mais prazer momentâneo. A mãe entra em casa e tento fingir um sorriso enquanto ainda sobe fumaça daquele resto de chama. Tento ser breve e rápido, mas no momento em que escrevi essa última linha, a chama fraca do cigarro se apaga, bem como a luz, a minha luz. Só a lembrança angustiante de algum prazer me consome agora. Na mesma hora em que a tosse me faz lembrar que mesmo durante o prazer a dor se faz presente. Levanto para jogar o resto de cinzas no lixo, mas com elas não se vai a dor. Não se pode jogar as dores no lixo, embora a felicidade já esteja lá muito antes das cinzas.
A vida não é mais nada além de um acender de cigarro, onde cada tragada é um sentimento bom que se acaba como uma baforada de fumaça, mas deixa resquícios dolorosos em nosso corpo, um prazer viciante e temporário que vai acabar me levando à morte, pois à dor e à loucura já me levou.