O cheiro do quarto, pela primeira
vez, me causou desânimo. Nada conseguia prender minha atenção ou manter-me
calmo. Sabia o que precisava fazer. Banho, roupas limpas e uma decisão: sair
para onde meus gritos de socorro não pudessem ser ouvidos por alguém, além de
mim. Rapidamente recolhi somente o necessário e, ao sair, disse baixinho à mãe,
palavras indistinguíveis – pois não queria ser encontrado.
Pensei em desistir. O pensamento
fixou-se durante todo o trajeto. Para minha surpresa, chegando ao local
predestinado, havia centenas, milhares de pessoas se divertindo, sorrindo,
passeando com suas famílias e havia eu, que, sucumbindo às pressões sociais
internas, isolei-me. Hoje, mais uma vez, o nosso voltaria a ser somente meu e o
meu apenas existiria.
Ao sentar no banco, retirei um
caderno da mochila, juntamente com uma caneta Bic que, inicialmente, insistia
em não rabiscar. Enquanto tentava fazer a caneta riscar, percebia o branco
espaço do papel e vi quanta liberdade havia naquilo. Nada de linhas, margens
imaginárias (ou reais) para restringir seu uso. Ao mesmo tempo, percebia quão
vazia estava aquela folha, esperando ser preenchida com sentimentos quaisquer.
Eu já não era mais como aquela folha.
Entre uma palavra e outra, ouvia sorrisos e via olhares desconfiados e desagradáveis daqueles que passavam.
Todos observavam estranhamente aquele animal solitário que, de costas para o mar,
não parecia estar ali, pois não admirava a beleza do lugar, do luar e,
tampouco, rendia-se perante o normal ou agia como os demais. Não podia. Tudo
estava estranho.
O som do mar batendo nas pedras
já não trazia afago, o vento levava as folhas do caderno e tentava fazer com que parasse
de escrever, e até mesmo o luar - hoje extremamente lindo - não me fez fixar os
olhos no céu por mais que alguns segundos.
Foi um dia de encontros.
Reencontros, por assim dizer. Vi as palavras voltarem, a angústia bater à
porta. Não havia lugar para mim, então me retirei do que era real. Percebi que,
naquele momento, eu voltara a ser como aquele branco espaço do papel, já no fim
da folha. Havia tanto já escrito, mas ninguém chegaria a ler. E havia um espaço
bem pequeno, onde novas coisas poderiam ser escritas, mas também esquecidas em um
rascunho qualquer de uma vida.